«O Estado Confessional e a Monarquia Constitucional
Quando a propaganda Republicana afirma que a Monarquia Constitucional falhou em separar a Igreja e o Estado, fala com rara, quase inédita, razão. Infelizmente para eles, essa razão não caminha no sentido que eles pretendem.
A encíclica "Rerum Novarum", que dá corpo à Doutrina Social da Igreja, foi entregue pelo Papa Leão XIII à comunidade católica em 1891. O governo português, que de toda a herança dos tempos do Absolutismo manteve, oportunamente, o beneplácito régio (antigo costume jurídico que fazia depender de autorização régia a publicação e circulação de documentos pontifícios em Portugal), optou por reter o beneplácito necessário à publicação do documento até depois de 1892. O conteúdo de interesse social desse documento revolucionário, especialmente na sua atenção ao direito de associação dos trabalhadores, opunha-se à doutrina liberal e aos interesses económicos dos poderes que sustentavam o regime constitucional.
Da mesma maneira, em 1884, é lançada a "Humanes Genus" pelo mesmo Papa, contra as sociedades secretas, resolvendo o governo da Monarquia "Fidelíssima" não permitir a sua circulação de todo, admoestando aqueles que a divulgassem, como aconteceu com D. Tomaz Gomes de Almeida, bispo da Guarda. Era este o Estado Confessional deposto em 1910. Não admira pois que a maioria do País Católico não tivesse levantado uma palha em prol da defunta e decadente Monarquia do trapo azul e branco. A República seria um Inimigo, mas um inimigo visível e de intenções claras e sobejamente conhecidas. Não valia a pena, de todo, para a hierarquia da Igreja Católica gastar energias a trocar este novo obstáculo pelo cancro parasitário da Monarquia Constitucional.»
Publicada por Manuel Marques Pinto de Rezende
1/
parte-se do princípio de que o país católico (ou seja, o povo maioritariamente católico, incluindo a maior parte da elite católica laica) estava consciente da censura régia em relação às encíclicas papais — o que não é, de todo, verdade.
2/
« A revolução francesa matou mais gente em apenas um mês e em nome do ateísmo, do que a Inquisição em nome de Deus durante toda a Idade Média e em toda a Europa. » — Pierre Chaunu, historiador.
O golpe-de-estado de 5 de Outubro de 1910 não foi um golpe liberal: pelo contrário, em muitos aspectos foi um golpe anti-liberal, porque teve por detrás dele uma ideologia jacobina e radical (a Carbonária e os seus acólitos de uma certa maçonaria francesa e irregular alimentada ideologicamente pelos Illuminati da Baviera). Os jacobinos franceses começaram por ser um dos instrumentos dos liberais na Revolução Francesa, para se transformarem no seu pesadelo (em bom português diríamos que "lhes saiu", aos liberais , “o tiro pela culatra”) o que se traduz na célebre frase de Pierre Vergniaud, revolucionário francês guilhotinado pelos seus camaradas:
“A Revolução devora seus próprios filhos.”
De resto, é um facto insofismável que em muitos outros países da Europa, o liberalismo coexistiu com a monarquia: por exemplo, em Inglaterra, na Holanda, na Suécia, na Dinamarca, só para referir alguns países. Portanto, dizer que “a queda da monarquia se deveu à monarquia constitucional” é falso: por detrás dos golpistas republicanos estava uma certa estirpe da maçonaria que de liberal1 não tinha absolutamente nada, como aliás se viu nos anos que se seguiram imediatamente ao golpe-de-estado.
3/
uma coisa é criticar a monarquia constitucional, que é criticável em muitíssimos aspectos; outra coisa é defender o absolutismo de D. Miguel que alguns mentecaptos defendem, contrapondo, de uma forma maniqueísta e em falsa dicotomia, o absolutismo ao liberalismo. Foi sempre esse o problema dos monárquicos portugueses: a ucronia — em vez de serem pragmáticos e realistas, e olharem o futuro tendo em conta o que temos no presente.
Percebe-se agora por que fui convidado a sair, com requintes de boa etiqueta, do blogue Prometheo Liberto: para que algumas pessoas possam escrever asneiras sem direito a contraditório.
Adenda: a resposta a este verbete foi dada por estoutro.
Notas
1. no sentido de liberalismo económico da escola escocesa.